domingo, 6 de janeiro de 2013

Afinal o mundo não vai acabar...

O aparecimento e a evolução da vida é um feito único e irrepetível de desafio à improbabilidade. Dizer "vida" é uma maneira de falar, pois tal coisa não existe. O que há são organismos vivos, que para se manterem nessa qualidade de vivos têm que se desenrascar, e, se o são, são-no por pouco tempo. A morte, a velhinha andrajosa com a gadanha na mão, é uma prosopopeia. Se a vida é organização é organização precária, pois cedo dá lugar à desorganização, ao retorno ao estado mineral.
O anseio dos organismos pela sobrevivência dá para tudo, tanto para uma moral de solidariedade, como para a safadeza do salve-se quem puder. E porque não há um árbitro sobrenatural, vale tudo. O inferno e o paraíso é o privilégio de quem tem um mínimo de escrúpulos. Para os demais, apenas resta o inferno da cupidez, o inferno próprio e o alheio.
Tudo é uma questão de saber quanto se cresce. Há quem fique para sempre a querer ter os brinquedos dos outros meninos. E a fazer birras e escaramuças até ter o que se quer. Mesmo que não precise, mesmo que prive os outros do que lhes é indispensável. E a escalada de apropriação passa dos brinquedos para a posse dos expoliados. E, quando não tem o que se quer, estraga-se tudo: assim, não fica ninguém com nada! Dê-se-lhe os nomes que se quiser: hoje chama-se economia liberalizada de mercado, mas no "meu tempo" chamávamos-lhe capitalismo.  Os nomes não importam: mudá-los não muda a realidade.
Tenho andado estes últimos anos fugido e escondido. Participei na líbia na defesa contra a agressão imperialista. O sonho de construir no magrb, no egypto e no próximo oriente um enclave civilista e laico contra o fundamentalismo islâmico esboroou-se, com a ajuda do integrismo cristão e do nazismo sionista. A Europa humanista e social deu o último tiro no pé. Afora já não tem um pé, tem um crivo de regador. Na próxima vintena, irá experimentar o que viu a américa do sul no século passado: extremos anómalos de pobreza e de riqueza, ditaduras militares, repressão dos opositores e silenciamento da imprensa, lutas armadas entre empresas rivais, estados opacos, movimentos subversivos e revoluções. Tudo à pala da democracia e para defesa do "estado social", sob a tutela de bruxelas, berlim e o vaticano... com música de beethoven.
Foi uma derrota para a humanidade, confesso, mas não senti que tenha saído da refrega derrotado. Assisti ao bárbaro assassinato do coronel. Não foi coisa bonita de se ver, mesmo para uma sensibilidade empedernida de guerreiro com muitos anos de refrega em muitos teatros de combate. Assisti a cenas do mesmo em todo o norte de áfrica e, agora, na síria. Ainda há quem coma do mito de que de um lado estão os bons e do outro os maus. Pantominíces do apocalipse de joão! O inferno sofisticou.
Regressei para umas breves férias e reencontrar-me com a patanisca e a myriam em portugal. O que vi, quando aqui cheguei, era-me impensável: um país vetusto humilhado por um gang de jovens sadomasoquistas a actuarem às ordens do império global! O que aconteceu às lusas virtudes? Não há padeiras de aljubarrota, marias da fonte e patuleias? Uma carbonária ou um buiça que dê nos cornos desses sociopatas? Estão comigo uns companheiros, uns ex daquilo a que em "sermo vulgaris" se chamava a CIA, o IRA, a ETA e o KGB, e outras siglas não exactamente com 3 letras, dispostos a dar uma ajudinha. Se houver quem queira. Porque as ajudas não se impõem aos ajudados. Isso fica para a caridade cristã.

Foi bom rever os gatos no tremontelo e o mano rui em lisboa. Contaram-me do relvas, a maior anedota do século. Deviam fechar todos os livros do eça num cofre forte. É que sai de lá cada personagem!

rodrigo rodrigues, "perditus", algures na lusitânia

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